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Folia de Reis de Santo Afonso

Written By Ana Claudia Gomes on domingo, 30 de dezembro de 2018 | 11:00


Palhaços da Folia de Reis de Santo Afonso - atentar para a presença da criança.


As folias devocionais são danças dramáticas que representam momentos do calendário católico, especialmente o nascimento de Cristo e a visita dos Reis Magos ao recém-nascido na manjedoura. Seus rituais incluem a peregrinação na comunidade e a visita a residências, especialmente aquelas que mantenham presépios, para cultuar o Menino Jesus e buscar oferendas, geralmente revertidas para a manutenção das comunidades católicas.
A Folia de Santo Afonso está em atividade pelo menos desde a década de 1920, como Folia de Reis - 26/12 a 06/01 -, já tendo atuado como Folia de São Sebastião - 06 a 20/01.

Segundo o atual mestre da folia, Osmar Gonçalves Diniz, a memória do grupo chega até seu bisavô, Chico Campestre, que foi seguido na liderança da folia pelos ancestrais Joaquim Nicolau (anos 1940), Antônio Izidoro e Milton Pedro Cândido. 
Conta ainda Osmar que, em sua infância, no final dos anos 40 e início dos 50, os foliões saíam de casa no dia 25 de dezembro e só retornavam no dia 06 de janeiro, dormindo em sedes de fazendas e até em meio a milharais, exaustos de tanto dançar. Recolhiam esmolas que custeavam a construção de templos populares e rurais, a exemplo daquelas dedicadas a São Sebastião.
"Tio Amilton", como é carinhosamente chamado pelos foliões de hoje, é o ancestral de mais cara memória nesta folia. Detinha grande habilidade de versejar e conhecia profundamente os fundamentos da folia. Preparou seus continuadores, o sobrinho Osmar e o principal cantador - Enderson "Liquita".
A Folia de Reis de Santo Afonso desenvolveu certas particularidades. Ao contrário de muitas folias que, residuais, apenas se reúnem em encontros especiais, como espetáculo, esta folia não tem o hábito de sair de sua comunidade. Resiste à espetacularização atribuída por pesquisadores às culturas populares originárias, e continua devocional. Atende a raros convites para visitar outros bairros ou cidades, o que tem acontecido mais frequentemente depois que foi registrada como patrimônio intangível de Betim.

Desenvolve também a inovação de ensinar crianças pequenas a atuarem como palhaços da folia, que são os principais atrativos para os foliões: os palhaços tanto representam os reis magos como personagens engraçados, mascarados, que dançam peculiarmente e pedem as esmolas. Quem dança com mais originalidade é presenteado pelo dono da casa anfitriã e outros cidadãos presentes.
Antigamente, as crianças não podiam acompanhar as folias, devido aos rigores dos campos. Hoje são atração na Folia de Santo Afonso, havendo expressivo número de garotos que atuam como palhaços.
Outra inovação da Folia de Santo Afonso é assimilar danças de massa contemporâneas, arrancando risos da assistência.
Ao contrário da tradição, esta folia não começa suas peregrinações na noite associada ao nascimento de Cristo, momento devotado às reuniões em família. Também não se encerra necessariamente no dia de Santos Reis, 06 de janeiro, e sim no sábado igual ou posterior a esta data. Na ocasião, não mais o templo católico recebe a culminância da folia, pois não há padre regular. A quadra da Escola Municipal Prefeito Alcides Braz, de Santo Afonso, é decorada, sediando as danças e orações finais da folia.
Ainda, refletindo mudanças na cultura religiosa brasileira, recebe participantes do movimento evangélico, assim como historicamente recebeu religiosos dos cultos afrobrasileiros - vide o mestre Joaquim Nicolau.
É também de praxe que as casas anfitriãs ofereçam lanches aos foliões. Hoje as esmolas são mais simbólicas e servem para custear o lanche do encerramento, especialmente destinado às crianças.
Salta aos olhos também o protagonismo das mulheres na Folia de Santo Afonso. Podemos citar Ilza Ferreira Cândido, esposa do “Tio Amilton”, que recentemente ainda recebia encomendas para confeccionar a roupa dos palhaços, e Maria Diniz, esposa do mestre Osmar, que atualmente cuida das roupas da Folia. Graças ao registro da Folia como patrimônio intangível do município, ela recebeu pequenos incentivos para adquirir novas roupas para os palhaços, porém estas são insuficientes para a demanda. Também recebeu ocasionalmente cursos de musicalização.

Além dessas funções tradicionais das mulheres, a Folia de Santo Afonso tem expressivo número delas atuando nas vozes mais agudas, que repetem os cantos puxados por Liquita. Antes essas vozes eram feitas apenas por cantores, e chamadas de quintas e requintas.
O mestre Osmar, com sua antiga sanfona, chefia os músicos. Era uma sua preocupação não ter um herdeiro para a função de sanfoneiro. Mas em 2017, conseguiu um candidato e começou a conduzir sua formação.

Referências

BETIM. FUNARBE. Cadernos da Memória. O patrimônio cultural de Vianópolis. Betim: Gráfica Paulinelli, 2009.
BETIM. FUNARBE. Dossiê de registro da Folia de Reis de Santo Afonso como patrimônio imaterial de Betim. Betim: 2011, mimeo.
GOMES, Ana Claudia. Notas de campo - Folia de Reis de Santo Afonso. 2009-2018, mimeo.
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